Com o avanço da epidemia de coronavírus, que já matou mais de 80 pessoas e alcançou 4 dos 5 continentes, biofarmacêuticas têm anunciado planos para o desenvolvimento de vacinas com apoio de universidades, grupos globais de saúde e dos governos dos Estados Unidos e da China.
Três desses projetos são financiados pela Cepi (Coalizão de Inovações em Preparação para Epidemias), uma parceria entre organizações públicas, privadas, filantrópicas e civis, lançada em Davos em 2017.
Entre os envolvidos estão as biofarmacêuticas Moderna e Inovio, a Universidade de Queensland (Austrália) e o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA.
De acordo com comunicado da Cepi, esses programas vão aproveitar as plataformas de resposta rápida para o desenvolvimento de vacinas já financiadas pela entidade, que adotam tecnologias que podem ser adaptadas para uso contra diferentes patógenos, inserindo novas sequências genéticas ou de proteínas.
A Universidade de Queensland (Austrália), por exemplo, anunciou na sexta (24) que tem uma nova tecnologia chamada de grampo molecular para o rápido desenvolvimento da vacina contra o coronavírus. Segundo Paul Young, diretor da Escola de Química e Biociências Moleculares da universidade, ela poderá estar pronta para testes clínicos em até seis meses.
Já Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos NIH (Institutos Nacionais de Saúde dos EUA), estimou que os primeiros ensaios clínicos para uma vacina possam ter início em abril.
Avançar do sequenciamento do vírus até os testes iniciais com humanos em apenas três meses seria um recorde na criação de uma vacina pela agência, segundo ele.
Isso se deve principalmente à rapidez com que cientistas chineses conseguiram identificar a sequência genética do novo coronavírus, que foi publicada em poucos dias.
Com o código genético em mãos, os pesquisadores puderam começar a trabalhar imediatamente no desenvolvimento de candidatas às vacinas, sem precisar de uma amostra do vírus.
“Dada a rápida disseminação global do vírus coronavírus, o mundo precisa agir rapidamente e em união para combater essa doença”, afirmou Richard Hatchett, CEO da Cepi, em comunicado.
Uma retrospectiva da história recente de outras epidemias de doenças infecciosas, como ebola, zika e Sars (síndrome respiratória aguda grave) mostra que essas vacinas enfrentaram um caminho longo e desafiador.
No surto de Sars, em 2003, houve uma corrida semelhante para o desenvolvimento de vacinas. Mais de 15 anos depois, ainda não há nada aprovado.
A primeira vacina contra o ebola, aprovada no mês passado nos EUA, surgiu após cerca de 20 anos de pesquisa e quatro anos de testes clínicos.
Os NIH ainda estão testando uma série de candidatas a vacina contra o zika, vírus transmitido por mosquitos que começou a se espalhar amplamente em 2015.
Segundo pesquisadores, isso ocorreu em parte porque os esforços de saúde pública ajudaram a impedir a propagação do vírus, tornando a vacina pouco necessária.
Outro desafio é encontrar fontes de financiamento que sejam mantidas mesmo quando a epidemia arrefecer, disse à Business Insider Maria Elena Bottazzi, co-diretora do Centro de Desenvolvimento de Vacinas do Hospital Infantil do Texas.
Para ela, a natureza reacionária desse tipo de financiamento é uma de suas maiores preocupações para o desenvolvimento futuro de vacinas.
Bottazzi conta que sua equipe estava desenvolvendo uma vacina contra a Sars quando a Mers (síndrome respiratória do Oriente Médio) eclodiu.
Isso levou a uma mudança no financiamento para se concentrar na Mers, às custas do desenvolvimento da candidata à Sars.
Com o coronavírus, ela aposta que o desafio será o mesmo quando algumas candidatas a vacina passarem para a fase dos testes clínicos.
“Os obstáculos científicos são os mais baixos”, disse ela. “Cientificamente, podemos nos movimentar rapidamente. Os maiores obstáculos são como mobilizar os recursos e criar as parcerias para levar essa vacina ao ponto de entregá-la à população.”
Botazzi estimou que o desenvolvimento de uma vacina contra o coronavírus com potencial para chegar ao mercado pode levar de um a três anos.
Moderna, empresa de biotecnologia com sede em Cambridge (Massachusetts), é outra empresa que anunciou planos de desenvolver uma vacina experimental contra o coronavírus.
O CEO da empresa, Stéphane Bancel, reconheceu que ainda há incógnitas sobre a doença que provavelmente criarão desafios aos testes clínicos.
“Ainda não temos certeza sobre o tempo de incubação do vírus nem por quanto tempo as pessoas ficam doentes”, disse Bancel ao Business Insider. “Isso tem implicações muito grandes para a modelagem [de uma vacina candidata] que você faz.”
Fonte: Folha de São Paulo